Ando escrevendo pouco, começo o texto com um eufemismo pra ocultar que na verdade eu ando a não escrever nada. Não obstante algumas discussões a respeito do que seja ou não machismo me levaram a tecer algumas suposições, que mais do que compartilhar como uma idéia ou noção pronta, gostaria de discutir com os mais variados interlocutores para tentar construir algum consenso, e ver se dessa cartola sai algum coelho.
Isso dito, e começando pelo começo, minhas elocubrações começaram quando recebi um grupo de vídeos realizados pelo distrito de Victoria na Austrália que são contra a violência familiar. De acordo com a página oficial dos vídeos, a violência familiar começa por meio de piadas sexistas e comentários inoportunos dirigidos às mulheres, coisas que acontecem nos vídeos que constam da página oficial, o 60sec, o BBQ, e o BAR.
Como explicitado na página oficial, e eu faço questão de fazer uma tradução “meia-boca” aqui pro português, porque merece a divulgação, devemos fazer objeções ou explicitar descontentamento quando alguém propaga uma piada machista, denigre um familiar causando-lhe tristeza, controla como o parceiro gasta o próprio dinheiro, onde vai, com quem, e tenta afastá-lo da própria família.
Além disso também pode demonstrar que não dá suporte à sexismos, assédio, papéis familiares rígidos no que se refere a gênero, estereótipos masculinos e femininos, homens controlando mulheres, ou homens falando sobre mulheres de modo agressivo e desrespeitoso, mesmo que seja em particular.
Até ai tudo bem, a grande maioria dos tópicos seguem regras básicas, não somente de boa educação, mas também de boa convivência. As situações demonstradas nos vídeos são bem ilustrativas, sendo a mais controversa pra quem não entende inglês ou não prestou atenção, a do BAR, onde o rapaz faz não somente piadas sexistas como também se propõe a paquerar a garota embasando-se em como ela se veste. Como recebi os vídeos por meio um mensageiro instantâneo, assisti uma edição que continha um vídeo a mais, onde um rapaz constrange uma moça no ônibus com o olhar. Esse vídeo em particular eu não sei se faz parte da mesma campanha.
A partir dai, comecei a pensar não exatamente sobre os vídeos e os comportamentos neles contidos, que são tão claros, quanto reprováveis. E eu estou em plena concordância com tudo o que diz a página da campanha oficial.
Não obstante passei a refletir sobre situações menos explícitas do que essas, levando em consideração por exemplo as paqueras, numa situação análoga a do vídeo do bar, que em tempos de caça as bruxas e Harvey Weinstein, têm pagado um pato enorme. Chamo de caça as bruxas porque as paqueras levam a má fama por muitas coisas que até considero aceitáveis, e são consideradas como assédio, incluso pior…
No vídeo do bar, pra me fixar nesse exemplo concreto, excluindo os comentários torpes, acho que sim, pode acontecer um flerte ali. Não obstante muitas amigas minhas consideram que não, e ainda me consideram machista por ter opinião diversa, o que pra mim é impressionante! Ai, uma coisa que acontece a menudo é o argumento tu quoque, que é exatamente o motivo de eu escrever o texto, em muitas discussões, quando começo a “livrar a culpabilidade dos paqueradores”, sejam homens ou mulheres, sempre sou interrompido com:
“-Você nunca vai entender, porque você não é mulher, você não sabe como é!”
Pra mim esse é o pior argumento, porque sem entrar no mérito do que eu disse, ou defendo, me desloca pra um “time” apenas por “ser quem sou”, ou defender o que defendo. Então, mas se eu fosse uma mulher, ou homem, que não se encaixa nos padrões de belezas impostos pela sociedade, eu também não entenderia, já que também não seria paquerado. Mas como forma de quebrar o argumento tu quoque, e defender meu ponto de vista, uso o argumento Catherine Deneuve, que em conjunto com outras mulheres na França, escreveu uma carta pública dizendo o seguinte:
“Os homens têm sido punidos sumariamente, forçados a sair de seus empregos, quando tudo o que eles fizeram foi tocar o joelho de alguém ou tentar roubar um beijo…”
“Estupro é crime, mas tentar seduzir alguém, mesmo de forma insistente ou desajeitada, não é – tampouco o cavalheirismo é uma agressão machista.”
As autoras argumentam que há um novo “puritanismo” no mundo.
“Essa febre de enviar “porcos” ao matadouro, longe de ajudar as mulheres a serem mais autônomas, serve realmente aos interesses dos inimigos da liberdade sexual, dos extremistas religiosos, dos piores reacionários”.
Ora, Deneuve é mulher, atriz e bonita, provavelmente no último ano, ela foi mais paquerada do que eu e todos os meus interlocutores seremos durante toda a nossa vida. E ainda assim ela defende um ponto de vista, que se não é igual, se parece muito ao que eu defendo. Na Espanha há um ditado que diz, pagam os justos pelos injustos, é certamente claro que as situações descritas nos vídeos da campanha contra violência são corretíssimas, tanto quanto uma pessoa comum, do dia-a-dia, que goste de paquerar, não precisa temer fazê-lo.
O texto nasceu, entre outras coisas, através de conversas com Heloisa, informações encontradas no Blog Meme de Carbono, e diversos jornais e afins ai pela internet.
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